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- 1º Grau
TJSC • Outros procedimentos de jurisdição voluntária • Política Fundiária e da reforma agrária • 0305819-63.2015.8.24.0036 • Vara da Fazenda Pública, Acidentes do Trabalho e Registros Públicos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina - Inteiro Teor
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Autos nº 0305819-63.2015.8.24.0036
Ação: Outros Procedimentos de Jurisdição Voluntária/PROC
Requerente: Everson Loss e outros
:
SENTENÇA
Everson Loss e outros , devidamente qualificado (s) nos autos, ajuizaram ação de regularização de propriedade plano estadual de regularização fundiária , com fulcro na Resolução n. 08/2014-CM, pelos fatos e fundamentos constantes da inicial de fls. 01/46, os quais, por brevidade, passam a integrar a presente sentença.
Após a manifestação das Fazendas ou o transcurso do prazo in albis , o Ministério Público se manifestou às fls. 1.318/1.319.
Após nova manifestação dos requerentes e do parquet , vieram os autos conclusos.
É o resumo.
DECIDO.
Cuida-se de ação de regularização de propriedade plano estadual de regularização fundiária fundada na Resolução n. 08/14-CM, ajuizada por Everson Loss e outros, na qual objetivam a regularização de diversas áreas constantes nas matrículas ns. 28.590, 11.711, 24.673, 41.294, 21.945, 24.847, 13.584, 11.546, 26.262, 36.930, 27.052,
15.062, 36.678, junto ao Cartório de Registro de Imóveis.
Necessário esclarecer, de início, que não há qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade na Resolução n. 08/2014 do Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
É que o objetivo essencial da referida norma é tão-somente a outorga dos títulos de propriedade (matrículas) para as famílias que ocupam áreas consolidadas, há vários anos, sendo na grande maioria dos casos famílias extremamente carentes, as quais dependem da respectiva titulação para alcançar direitos básicos de cidadania.
Tal situação, em caso de procedência do pedido, apenas outorga os títulos respectivos, não legalizando eventual parcelamento irregular do solo. Em outras palavras, um loteamento não deixa de ser ilegal em razão das famílias lá residentes conseguirem acesso aos títulos de propriedade; tal ilegalidade - do loteamento - persiste, podendo posteriormente ser o loteador responsabilizado ou até mesmo o Município, de forma subsidiária (cf. AgInt no REsp 1338246 / SP, Min. Herman Benjamin, DJe 20.04.2017).
Feitos os esclarecimentos necessários, a Resolução n. 08/2014 do Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça de Santa Catarina instituiu o projeto "Lar Legal", o qual tem por finalidade viabilizar a regularização de ocupações fundiárias não planejadas/autorizadas administrativamente, conferindo aos residentes destas, geralmente pessoas de parcos recursos, uma moradia condigna, com acesso a equipamentos e serviços públicos básicos.
O seu art. 1º dispõe:
"O reconhecimento do domínio sobre imóvel urbano ou urbanizado, integrante de loteamento ou desmembramento (fracionamento ou desdobro) não autorizado ou executado sem a observância das determinações do ato administrativo de licença, localizado em área urbana consolidada, implantada e integrada à cidade, excluídas as áreas de risco ambiental ou de preservação permanente definidas em lei, em favor de pessoas preponderantemente de baixa renda, poderá ser obtido conforme o disposto nesta resolução".
Já o § 1º do artigo 1º assim prevê:
"Considera-se área urbana consolidada a parcela do território urbano com densidade demográfica considerável, malha viária e, ainda, no mínimo, dois equipamentos de infraestrutura urbana (drenagem de águas pluviais, esgotamento sanitário, abastecimento de água, distribuição de energia elétrica, limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos) implantados, cuja ocupação, de forma mansa e pacífica, há, pelo menos, cinco anos, a natureza das edificações existentes, dentre outras situações peculiares, indique a irreversibilidade da posse que induza ao domínio".
Importante ressaltar que nenhuma das partes ouvidas no presente feito invocou a alegação de que não se trata de situação consolidada.
Nessa senda, é inarredável a conclusão de que a área em questão consiste em "situação consolidada", conforme previsão legal supra, e, portanto, aplicável ao caso em tela o procedimento de regularização regulamentado pela Resolução n. 08/2014-CM.
Necessária, assim, a análise da satisfação dos demais requisitos para regularização fundiária.
O art. 4º da Resolução dispõe:
"A petição inicial deverá ser instruída com:
I certidão atualizada da matrícula do imóvel objeto do loteamento ou desmembramento ou certidão de registro de imóveis comprobatória de que não está registrado;
II - certidão negativa de ação real ou reipersecutória referente ao imóvel expedida pelo respectivo ofício do registro de imóveis;
III - certidão de ônus reais relativos ao imóvel;
IV - planta simplificada da área, com as respectivas divisas, acompanhada do memorial descritivo assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica ART (...) .
V nome, domicílio, nacionalidade, estado civil, profissão, número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda do proprietário, confrontantes e de seus cônjuges, se casados forem;
VI cópia dos documentos pessoais e dos comprobatórios da compra e venda ou da titularidade da posse do imóvel;
VII declaração dos órgãos competentes, preferencialmente municipais, de que não se trata da área de risco ambiental ou de preservação permanente definida em lei;
VIII lei do município autorizadora, na hipótese de imóvel público ou sob intervenção do Poder Público".
Os documentos juntados aos autos são suficientes para conferir aos autores o título de possuidores e pretensos proprietários de seus respectivos lotes (inciso VI). Ademais, a situação de carência dos moradores da área demonstra que a maioria dos lotes foram adquiridos tacitamente, sendo assim, alguns moradores não possuem documento comprobatório de posse.
Foram juntadas as certidões negativas de ação real ou reipersecutória e de ônus reais relativos ao imóvel.
Foi juntada planta conjunta referente aos imóveis dos requerentes, acompanhada do memorial descritivo, restando cumprido, assim, o inciso IV.
A anuência dos confrontantes está revelada e, no mais, possui anuência do próprio Município.
No mais, pela farta documentação juntada aos autos, percebe-se que trata-se de área consolidada, não existindo oposição por parte de nenhum dos interessados.
Desnecessária, nesse ponto, realização de estudo social, já que comprovadamente tratam-se de famílias carentes, tendo sido deferido os benefícios da Justiça Gratuita.
Quanto à documentação necessária, colhe-se de recente decisão do nosso egrégio Tribunal de Justiça:
"APELAÇÃO CÍVEL. PROCEDIMENTO ESPECIAL DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA.
REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA. PROVIMENTO N. 37/1999 DA CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA. RESOLUÇÃO N. 8/2014 DO CONSELHO DA MAGISTRATURA. PROJETO LAR LEGAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL ACERCA DA COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS. QUESTÃO DECIDA PELO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO EM INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. ART. 947 DO CPC/2015. TESE REVISTA. IMPRESCINDIBILIDADE DE LAUDO ASSINADO POR PROFISSIONAL DA ÁREA, COM RESPECTIVA ANOTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE. EXIGÊNCIA ATENDIDA PELO MUNICÍPIO DE CONCÓRDIA PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO.
'A apresentação de provas fornecidas pelo Poder Público, desde que elaboradas por profissional técnico com anotação de responsabilidade, e capazes de demonstrar a real situação do imóvel objeto da regularização registrária, revela- se suficiente para evidenciar que a pretensão exordial de registro do bem em matrícula imobiliária própria, no contexto do Projeto 'Lar Legal', criado pelo Provimento n. 37/99, da Corregedoria-Geral da Justiça de Santa Catarina, atendeu aos requisitos normativos e legais de estilo'. (AC n. 0002958-59.2014.8.24.0022, de Curitibanos, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 14/9/2016)' (Ap. Cív. n. 0002391- 71.2013.8.24.0019, de Concórdia, Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. 06-06-2017).
Assim, percebe-se que farta a documentação de que trata-se de área consolidada.
Importante ressaltar que a correção de eventuais problemas ambientais, caso existentes, não é objeto do Programa Lar Legal, uma vez que expressamente"não se incluem nos objetivos do Projeto Lar Legal a implantação de planos de regularização fundiária ou ambiental, excluindo-se do rito estabelecido nesta resolução os processos que tenham tal finalidade"(art. 1º, § 5º, da Resolução CM n. 8/2014, com alteração pela Resolução CM n. 8/2016).
O fato de, eventualmente, a área ser de Preservação Permanente, por si
só, não impede o deferimento do pedido, já que apenas se reconhece o domínio. Esta discussão, aliás, muitas das vezes sequer é travada nos processos de usucapião (quando muito se determina o averbamento da área junto à matrícula).
Para arrematar, importante consignar que, surgindo futuramente eventuais prejudicados, estes não restarão desamparados, uma vez que, nos termos do art. 14 da Resolução"o registro poderá ser retificado ou anulado, parcialmente ou na totalidade, por sentença em processo contencioso, ou por efeito julgado em ação de anulação ou de declaração de nulidade de ato jurídico, ou de julgado sobre fraude à execução".
ANTE O EXPOSTO, e por tudo mais que dos autos consta, julgo procedente esta ação de regularização de propriedade plano estadual de regularização fundiária formulada pelos autores nominados na inicial para declarar o domínio sobre as respectivas áreas individualizadas na planta e memoriais descritivos acostados aos autos, servindo a presente decisão como título para registro no Ofício de Registro de Imóveis, resolvendo o mérito da causa com base no art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Registre-se que por se tratar de aquisição originária, incabível a incidência de ITBI.
Custas legais, observando que foi deferido aos requerentes os benefícios da Justiça Gratuita.
Nos termos do art. 15 da Resolução 08/2014:"Tratando-se de reconhecimento do domínio requerido pelo município ou por adquirentes beneficiários da gratuidade da justiça, não serão devidas custas ou emolumentos notariais ou de registro ou recolhimento de valor ao Fundo de Reaparelhamento da Justiça decorrentes do registro do parcelamento do solo do primeiro registro de direito real constituído em favor destes e da primeira averbação da construção residencial existente no imóvel".
Sem honorários.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transitado em julgado, a certidão com a averbação da sentença na matrícula do imóvel, expedida pelo ofício do registro de imóveis competente, deverá ser encaminhada ao Diretor do Foro da comarca de origem do processo, a quem competirá efetuar a entrega ao titular da propriedade (art. 5º da Resolução CM n. 1/2017).
Nada mais havendo, arquive-se.
Jaraguá do Sul (SC), 02 de março de 2018.
Fernando Seara Hickel
Juiz de Direito
(cf. Resolução CM n. 4/2016)"DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE